O que são indicadores?
Indicadores são formas de se verificar um conceito na realidade. Tipicamente são usados para medir a variação de um fenômeno. Nas ciências sociais, é muito frequente usarmos indicadores existentes, produzidos por grandes institutos de pesquisa ou mesmo pelo governo e amplamente divulgados na mídia.
No trabalho de um avaliador, indicadores conhecidos nem sempre dão de conta medir a variação que responde às perguntas de nossos clientes; nesses casos temos de construir novos indicadores.
Já falamos aqui brevemente de como indicadores são imprescindíveis para avaliar e monitorar o desempenho de instituições, órgãos e empresas. Mas ainda não discutimos o processo de construção deles ou mesmo do impacto que podem ter em nossas vidas; falaremos disso hoje.
Como são feitos?
De modo bastante direto: não importa quão conhecido ou novo seja o indicador, ao se apresentar os resultados de sua aplicação é preciso explicitar quais foram as definições dos conceitos que o nortearam e quais as dimensões escolhidas para compô-lo. Em outras palavras: dizer o que exatamente ele mede.
Explico um pouco mais.
Por muito tempo o principal indicador de pobreza foi a renda de um indivíduo, de chefe de domicílio, ou mesmo a renda domiciliar, ou seja, essencialmente um indicador econômico. Em 1997, a ONU produziu o Human Poverty Index (HPI), Índice de Pobreza Humana, que media privação em três esferas da vida humana: longevidade, conhecimento e padrão de vida decente[1]. Como o conceito de pobreza foi ampliado, se fez necessário medi-lo em mais dimensões.
É também recente a discussão sobre o PIB (Produto Interno Bruto). Medido em todos os países, é um indicador tão impactante na vida de uma nação a ponto de seu crescimento ser quase sempre o principal objetivo da política econômica. Em 2014, Michael Green, criador do Social Progress Index, indicou, em um TED Talk Global, o frequente uso do PIB como uma forma de mensurar quão bem-sucedidos são os países. Ele retorna ao economista e ao documento que inspiraram a criação do PIB, Simon Kuznets, que em 1934 entregou ao governo americano um relatório intitulado “National Income, 1929-1932”. O PIB, como expõe Green, mede desempenho econômico, e não bem-estar humano. É claro que há relação entre essas duas dimensões, na medida em que mais riqueza sendo produzida gera novas oportunidades para as pessoas, mas não corresponde ao conceito de bem-estar.
Isso significa que HPI e PIB são indicadores ruins?
Não exatamente. Diria que são indicadores sedutores. Por sua simplicidade e uso disseminado, é tentador atribuir a eles a mensuração de fenômenos que, na realidade, acabam não sendo medidos por limitações da definição e das dimensões analisadas por esses indicadores.
Reforço: é preciso que, antes de provocar alardes com relação aos números apresentados, quem o utilizará tenha clareza do que o que o indicador de fato mede, e, portanto, qual parcela da realidade ele de fato exibe[2].
E o que é um bom indicador?
Essa pergunta envolve várias dimensões práticas, como a facilidade de obtenção de dados e a simplicidade do processo de coleta, e metodológicas, como sua capacidade de capturar a variação existente, de ser aplicado em diversos momentos e lugares com os mesmos resultados, e também e fundamentalmente sua pertinência ao conceito que se quer medir.
Um indicador pertinente é aquele que faz a ligação entre um conceito e um fenômeno com a maior exatidão possível. Em outras palavras, quão bem o indicador mede, traduz, ou representa o conceito na realidade?
Para tanto, é preciso justificar suas escolhas de dimensões mensuradas. É particularmente importante explicitar essas informações quando criamos um indicador novo e que atende especificamente às necessidades de um projeto. Os indicadores ditos “mais conhecidos” e “amplamente divulgados” fazem isso no mais das vezes, mas nem todos que os utilizam atentaram ao processo de sua criação, o que evitaria uma série de equívocos.
Um exemplo desta prática? Em 2010, em um aprimoramento e também substituição do HPI, a OPHI (Oxford Poverty & Human Development Initiative) e o PNUD (United Nations Development Programme) desenvolveram o Multidimentional Poverty Index (MPI), ou Índice de Pobreza Multidimensional. Esse índice considera que pobreza não é “apenas” questão de renda, longevidade, conhecimento e padrões de vida, mas também uma série de privações sofridas simultaneamente pelo indivíduo / núcleo familiar e que concernem dimensões de saúde e educação.
Aqui temos um conceito tão amplo e complexo que sua mensuração integral fica bastante comprometida na prática, a ponto de não poder ser aplicado de forma idêntica em todas as sociedades. Por isso, os criadores do MPI dizem abertamente que trata-se de um indicador flexível, e que comporta, portanto, a opção por diferentes dimensões explicitando sempre o motivo das escolhas. Nas palavras de uma das autoras do MPI,
o método é flexível e pode ser usado com diferentes dimensões, indicadores, pesos e limites (cut-offs) para criar medidas específicas para diferentes sociedades e situações. Pode ser usado para medir pobreza, bem-estar, serviços ou transferências condicionais de dinheiro (conditional cash transfers) para monitoramento e avaliação de programas.(SANTOS, ALKIRE, 2011, p. 17)[3]
Assim, temos um mesmo conceito que para ser bem capturado requer indicadores diferentes! Essa também é a ideia por trás do Índice de Progresso Social de Michael Green. O IPS é medido de formas distintas para que tenha o mesmo significado quando se compara países, quando se estuda municípios de uma mesma região, ou comunidades locais.
Saiba mais:
Can we improve the way we measure poverty? The UN’s new poverty index. http://oxfamblogs.org/fp2p/can-we-improve-the-way-we-measure-poverty-the-uns-new-poverty-index/
[1] Podem ser encontradas aqui: http://hdr.undp.org/en/statistics/understanding/indices/hpi
[2] Problema conhecido em metodologia como “operacionalização”.
[3] SANTOS, Maria Emma; ALKIRE, Sabina. Training Material for Producing National Human Development Reports: The Multidimensional Poverty Index (MPI). 2010.
Excelente artigo a respeito de indicadores.
“Um indicador pertinente é aquele que faz a ligação entre um conceito e um fenômeno com a maior exatidão possível. Em outras palavras, quão bem o indicador mede, traduz, ou representa o conceito na realidade?”
Este trecho é muito interessante ao lembrarmos o quão heterogêneo é o Brasil, com suas peculiaridades regionais, especificidades culturais e os distintos graus de desenvolvimento social e econômico das regiões brasileiras, é mais do que importante, é uma medida de responsabilidade pública o desenvolvimento de “Bons Indicadores” conforme consta no artigo.
Atualmente nós temos diversos meios de coleta e armazenamento de dados, porém muitas vezes falta uma boa gestão destes recursos (dados), eles são uma ótima ferramenta de lutar e manter os direitos fundamentais constitucionais, como por exemplo o acesso a educação de qualidade, acesso a segurança, transporte e etc.
Parabéns pela postagem Plan Políticas Públicas.